Em tempos de grandes desafios, certas sensações parecem dar tom aos (novos) rumos da existência. Desde o início de 2020, quando a pandemia passou a ameaçar a vida humana no Planeta, um sentimento tornou-se usual entre as pessoas.
Trata-se da angústia, sensação naturalmente atrelada – no caso – não apenas ao martírio da quarentena, mas, também, ao medo da morte e às dúvidas em relação aos nebulosos movimentos no horizonte.
Interessante lembrar que a discussão de tal tema, na atualidade, possa se alimentar do pensamento elaborado, no século XIX, pelo filósofo teólogo, poeta e crítico social dinamarquês Søren Kierkegaard, autor do livro O conceito de angústia.
Na obra, conforme destacado no subtítulo, o autor pretende realizar o que chama de “simples reflexão psicológico-demonstrativa direcionada ao problema dogmático do pecado hereditário de Vigilius Haufniensis”.
De modo bem-humorado – e atento ao “método” socrático, já que os leitores são levados a questionar suas próprias certezas –, Kierkegaard usa o pseudônimo de “o vigia de Copenhague” para discutir as responsabilidades do indivíduo e as heranças “do mal”.
Dividido em cinco capítulos, o livro problematiza a angústia como “pressuposição do pecado hereditário”, além de perscrutar o sentimento em relação à “falta de espírito”, ao destino, à culpa, à maldade e ao bem.
Trecho
“A angústia é uma qualificação do espírito que sonha, e pertence como tal à Psicologia. Na vigília está posta a diferença entre meu eu e meu outro; no sono, está suspensa, e no sonho ela é um nada insinuado. A realidade efetiva do espírito se apresenta sempre como uma figura que tenta sua possibilidade, mas se evade logo que queria captá-la, e é um nada que só pode angustiar. Mais ela não pode, enquanto apenas se mostra. O conceito de angústia não é tratado quase nunca na Psicologia, e, portanto, tenho de chamar a atenção sobre sua total diferença em relação ao medo e outros conceitos semelhantes que se referem a algo determinado, enquanto que a angústia é a realidade da liberdade como possibilidade antes da possibilidade. Por isso não se encontrará angústia no animal, justamente porque este em sua naturalidade não está determinado como espírito.”
O livro
Livro: O conceito de angústia – Uma simples reflexão psicológico-demonstrativa direcionada ao problema dogmático do pecado hereditário de Vigilius Haufniensis
Autor: Søren Kierkegaard
Tradutor: Álvaro Luiz Montenegro Valls
Editora: Vozes de bolso
Páginas: 224
Ano: 2015