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As mil faces do julgamento virtual

Histórias de linchamento público via web revelam como, em tempos de isolamento social e intensa relação online, é preciso maneirar nos juízos e nas certezas absolutas

Ciência na Estante

A temida invisibilidade do coronavírus tem obrigado os habitantes do planeta azul à experimentação de outros tantos formatos de sociabilidade. Dentre tais mecanismos de relacionamento e comunicação, a internet, obviamente, revela-se protagonista.

Para além de lives solidárias ou informações acerca da covid19, contudo, a rede mundial apresenta-se, por vezes, como espaço propício à vã condenação “do outro”. No livro reportagem Humilhado, Jon Ronson investiga e apresenta a história de vidas arruinadas pelo “tribunal” da world wide web.

Diretor de documentários e autor de best-sellers como O teste do psicopata, Ronson inicia sua narrativa de modo autobiográfico: ele próprio, afinal, tornou-se vítima do júri virtual, devido aos experimentos acadêmicos de um ex-pesquisador da University of Warwick, que, sem autorização, criou, no Twitter, um desbocado perfil do escritor.

Afora o inacreditável vai-e-vem de Ronson em busca de seus direitos de expressão e identidade, o livro reportagem narra, descreve e analisa, a partir de entrevistas com humilhados(as) e da pesquisa de dados públicos, alguns dos mais intricados e cruéis processos de aniquilamento de vidas e reputações.

Nos 15 capítulos da obra, leitores e leitoras terão a oportunidade de reavaliar suas próprias – e, amiúde, problemáticas (apesar de aparentemente banais) – atitudes no convívio online, diante do impacto de imbróglios como “Jornada ao paraíso livre de humilhação”, “Uma cidade em polvorosa pela prostituição e por uma lista de leitores” ou “O homem que pode mudar os resultados de busca do Google”.

julgamento virtual
Foto: Maurício Guilherme Silva Jr.

Trecho

“E então, um dia, eu me toquei. Algo realmente importante estava acontecendo. Aquele era o início de um grande renascimento da humilhação pública. Depois de grande uma calmaria de 180 anos (punições públicas tiveram fim em 1837 no Reino Unido e em 1839 nos Estados Unidos), ela estava de volta em grande estilo. Ao empregar a humilhação, usávamos uma ferramenta muito poderosa – coerciva, sem fronteiras e com velocidade e influência cada vez maiores. Hierarquias eram horizontalizadas. Os silenciados ganhavam voz. Era como a democratização da justiça. Então tomei uma decisão. Da próxima vez que uma grande humilhação moderna começasse contra algum malfeitor importante – da próxima vez que a justiça praticada pelos cidadãos prevalecesse de um modo dramático e correto – eu iria participar. Investigaria de perto e faria uma crônica sobre o quanto essa prática era eficiente em corrigir injustiças.”

O livro

Livro: Humilhado – Como a era da internet mudou o julgamento público
Autor: Jon Ronson
Tradução: Mariana Kohnert
Editora: Best Seller
Páginas: 304
Ano: 2015

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