No exato momento em que bilhões de moradores do planeta azul veem-se obrigados a permanecer em casa, devido à ameaça do coronavírus, lembramo-nos, mesmo que por um segundo, da existência de certa estrutura seminal… à própria vida. Curioso pensar, afinal, que o corpo humano – “território”, por excelência, dos maiores prazeres e dores do indivíduo – ganhe visibilidade e atenção, no cotidiano de seus “donos”, apenas no instante em que riscos e enfermidades tornam-se iminentes.
Em Anatomias, o escritor e jornalista Hugh Aldersey-Williams, autor de obras de divulgação científica e ex-curador do museu e biblioteca Welcome Collection, em Londres, recorre a searas diversas (sociologia, arte, ciência, literatura etc.) para discutir e reencenar fatos, histórias e informações acerca da constituição física do homem.
Capítulos
Para tal, Aldersey-Williams estrutura os capítulos do livro segundo características, funções, mitos e especificidades de cada parte do mecanismo corpóreo, o que inclui carne, ossos, cabeça, rosto, cérebro, coração, sangue, orelha, olho, estômago, mão, sexo, pé e pele.
Há espaço, ainda, para problematizações em torno do mapeamento do “território” – quando se investiga o corpo na configuração de sua totalidade – e dos contornos sob o véu do futuro, momento em que o autor aborda os entrelaçamentos entre a natureza física, os mecanismos de autotransformação e os múltiplos usos da tecnologia.
Em meio à pandemia, o livro há de se metamorfosear, para leitores e leitoras, na oportunidade de autorreflexão acerca da complexa máquina de “carne, ossos e fluidos” que, a cada manhã, torna possível o breve (porém, intenso) exercício do existir.
Trecho
“Chega um momento na vida em que você percebe que provavelmente, afinal de contas, não será a primeira pessoa a viver para sempre. Essa conscientização é normal, ou pelo menos suponho que seja, mas é totalmente contrário à nossa expectativa de direito adquirido. Ela é um choque. Sejamos francos. Sua mente não tem problema nenhum com a ideia de viver para sempre. O que há de errado em simplesmente continuar como está agora? Ela não vê motivo para parar. Não. Seu corpo é que é o problema. Ele começa a não funcionar tão bem. E começa a se queixar, enviando-lhe mensagens cada vez mais frequentes, mensagens carentes, irritantes. ‘E eu? Ninguém está me ouvindo? Pare com isso, está me machucando.’ Ou: ‘Quero ir ao banheiro.’ ‘Como assim, agora?’, responde a mente, sonolenta. ‘São três da manhã.’ ‘É, agora.’”
O livro
Livro: Anatomias – Uma história cultural do corpo humano
Autor: Hugh Aldersey-Williams
Tradução: Waldéa Barcellos
Editora: Record
Páginas: 364
Ano: 2016