Fundamentais às perspectivas de desenvolvimento econômico, político, cultural e/ou científico de qualquer nação, jovens cultivam ideais e reflexões bastante particulares acerca dos vultos da contemporaneidade.
Daí a importância de ouvi-los: sua voz ecoa parte importante das dinâmicas de nosso zeitgeist (o “espírito do tempo”).
No que diz respeito às práticas científicas e às tecnologias, dar voz à juventude é a possibilidade de compreender o nível de atenção de tal público a uma série de questões relacionadas à produção do conhecimento.
Por meio de pesquisa do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), vieram à tona relevantes nuances por trás da abrangente indagação: “O que os jovens brasileiros pensam sobre ciência, tecnologia e inovação?”
Divulgados no dia 24 de junho, no Museu da Vida da Fiocruz, no Rio de Janeiro, os resultados permitem que se compreenda melhor o interesse da juventude do País por ciência, assim como facilitam a análise de mecanismos de acesso à informação e de hábitos culturais.
O intervalo de confiança da pesquisa é de 95%, com margem de erros de 2%. Foram realizadas entrevistas domiciliares com 2.206 pessoas, de 15 a 24 anos de idade, em todas as regiões do Brasil.
Benefícios à humanidade
Em primeiro lugar, o estudo mostra que a maior parte dos jovens brasileiros (69%) acredita que a ciência “traz muitos benefícios para a humanidade” e deseja maior investimento, por parte do Governo, na produção de saberes, mesmo em tempos de dificuldade econômica – no total, 60% dos entrevistados assim se pronunciaram.
No que diz respeito ao consumo de informações sobre Ciência e Tecnologia (C&T), o Google (79%) se revelou o mecanismo central das buscas dos mais jovens, seguido por YouTube (73%), WhatsApp (51%), Facebook (50%), Instagram (39%), blogs (15%), Twitter (11%) e podcast (5%).
Para comentar e repercutir tais assuntos, os professores (55%) se revelam os indicados pelos jovens, seguidos por amigos (41%) e outros parentes (21%).
Os docentes também são tidos, por 50% dos entrevistados, como “fontes mais confiáveis” em assuntos ligados à C&T, enquanto, no posto de “menos confiáveis”, estão os políticos (81,3%).
Defesa da ciência
Diante da questão “Sabendo que os recursos de qualquer governo são limitados, que gastar mais com alguma coisa significa ter que gastar menos com outras, você acredita que o Governo Brasileiro deveria aumentar, manter ou diminuir os investimentos em investigação científica?”, os jovens defenderam a manutenção de recursos.
Para 60% dos entrevistados, é preciso aumentar os investimentos em C&T, enquanto, no ver de 34%, há, ao menos, que manter a atual destinação de recursos. Apenas 6% dos jovens indicaram, como saída momentânea, a diminuição do financiamento.
Luisa Massarani, Coordenadora do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia, explica que este é o primeiro estudo deste tipo com jovens no Brasil e que, em nível internacional, é inovador tanto pelo estudo em si quanto pelo fato de incluir etapas qualitativas.
“Apesar de nosso imaginário social de que os jovens não teriam interesse por temas de ciência e tecnologia, nossos estudos mostram que, sim, se interessam, e mais do que por temas de esporte, nosso orgulho nacional”, destaca a pesquisadora.
Identificar que jovens têm uma visão positiva da ciência e uma grande confiança nos cientistas, inclusive afirmando que deve haver mais recursos para ciência e tecnologia, foi um dos resultados que mais surpreenderam.
“O YouTube parece ser uma ferramenta importante de busca e acesso à informação científica, em contraposição a visitas a museus de ciência. Mas nossos resultados mostram também que os jovens têm dificuldade de mencionar nomes de cientistas e instituições de pesquisa brasileiros. Os jovens também relatam ansiedade sobre a veracidade de informações em geral e de ciência que recebem e dificuldades em descobrir se tais informações dão verdadeiras”, explica Luisa Massarani.
Obstáculos
Os jovens relatam também que perderam o protagonismo na busca e no acesso das informações (em geral e de ciência), passando a recebê-las de maneira passiva – elemento que se complexifica a partir da dinâmica das fake news na atualidade.
Assim, na contramão das benesses e possibilidades da C&T, estão os hábitos de consumo de práticas científicas, devido, pelo que se intui, a uma série de problemáticas políticas, econômicas e sociais.
Nos últimos 12 meses, por exemplo, apenas 6% dos entrevistados visitaram “algum museu de ciência ou centros de ciência tecnologia”.
Como justificativa motivadora para tal baixa frequência, 26% dos jovens dizem que tais espaços “não existem em sua região”; 17% declaram não ter tempo; 11% não se mostram interessados; 9% garantem que moram longe; e 6% confessam não ter dinheiro para a atividade.
Em relação à “atratividade da profissão de cientista”, a maioria dos entrevistados (46%) a considera “muito atrativa”, enquanto 38% a tomam por “atrativa” e 11% por “pouco atrativa”.
Na contramaré de tais índices, a expectativa por se dedicar à atividade parece repleta de obstáculos: 49% e 44% dos jovens, respectivamente, consideram “muito difícil” e “difícil” de alcançar o ofício.
Imaginário(s)
Qual a visão da juventude brasileira acerca da figura do cientista?
Tal questão foi feita aos entrevistados pela pesquisa do INCT-CPCT, que, em primeiro lugar, consideraram “provável” ou “muito provável” que os pesquisadores “são criativos” e “aprendem rapidamente coisas novas (96%), assim como “são organizados” (93%).
No que tange à sociabilidade, para 88% jovens, os dos cientistas “pensam muito em suas famílias”; “evitam festas e a vida social” (77%); “passam quase todo o tempo sozinhos” (75%); “têm poucos amigos” (70%); “são esquisitos” (60%); e, em geral, “não são muito atraentes” e “não têm um casamento feliz” (54%).
Perguntada sobre de que modo os resultados da pesquisa podem servir de escopo ao desenvolvimento de políticas públicas para ciência no Brasil, a pesquisadora Luisa Massarani respondeu que, aproveitando o interesse dos jovens por temas de ciência e tecnologia, é preciso traçar políticas que estimulem e apoiem iniciativas de divulgação científica.
“Essas iniciativas devem ser destinadas a jovens, devem permitir maior engajamento em temas de ciência e tecnologia, tanto no escopo formal, como nas escolas, como não formal, por exemplo, via YouTube“.
O objetivo, segundo ela, é aumentar o conhecimento sobre a ciência brasileira e os atores sociais que a fazem, ou seja, as cientistas e os cientistas brasileiros.
“Além disso, é importante estimular iniciativas que empoderem os jovens, no sentido de se sentirem menos vulneráveis a receber e identificar fake news, bem como a tornarem-se protagonistas na busca e no acesso de informações“, conclui Massarani.