O comércio eletrônico movimenta o mercado de vendas no Brasil e no mundo. Por um lado, facilita a vida do consumidor e acaba se tornando o carro-chefe de muitas empresas. Por outro, exige planejamento de logística por conta das entregas urbanas de encomendas. Pensando nisso, a pesquisadora do Programa de Doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Itajubá (Unifei) e professora da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), Roberta Alves, estudou a dinâmica desse “delivery”, analisando opções alternativas.
“Observa-se grande crescimento das entregas do e-commerce, que geram custo para transportadoras, lojas e cidades. Há caminhões maiores circulando com esses produtos, o que gera poluição, ruído e congestionamentos”, afirma.
A pesquisadora aponta alguns “gargalos” logísticos: se um grande veículo está carregado de produtos para deixar em algum supermercado na cidade, ele fará rota única. No entanto, se este mesmo veículo fizer pequenas entregas domiciliares provenientes de compras online, precisará de várias paradas e trajetos. Há também o problema gerado pelas as reentregas, pois nem sempre o consumidor está em casa para receber o produto, o que gera nova viagem da transportadora ou da prestadora de serviço (como os Correios). No Brasil, são comuns três tentativas de entrega e nem toda loja oferece opção de escolha do horário.
“É por isso que estamos estudando a instalação de entregas automáticas, conhecidas como pick-up points. Um exemplo deste modelo é o Amazon Locker, já implantado fora do país”, explica. Nesse caso, o consumidor passa e ter um armário onde podem ser depositados os produtos comprados online. É claro, somente objetos com dimensões pequenas e a retirada fica por conta do proprietário. Na Europa, existem outros serviços parecidos, como o DHL Locker.
Amazon Locker é um serviço de entrega de autoatendimento oferecido pela varejista Amazon.com. Os clientes podem selecionar, como seu endereço de entrega, qualquer local com quiosque Amazon Locker. Assim, passam a receber pedidos nesse local. O programa foi lançado em setembro de 2011 e, atualmente, está em 900 cidades dos Estados Unidos, além de localidades na Europa em que a Amazon faz parcerias com outras empresas de varejo e logística.
Vantagens
“Os lockers poderão se consolidar como uma opção no Brasil, a depender do uso que os consumidores farão. Em São Paulo, há um modelo em teste e implantação, porém ainda não foi muito divulgado. Se uma transportadora entrega 20 pedidos em um locker, deixa de fazer 20 paradas. Nessa iniciativa de São Paulo, observou-se que transportadoras não acessam alguns lugares por causa do risco. Se houvesse um locker por perto, o consumidor receberia as compras”, analisa Roberta Alves.
Recentemente, ela apresentou o artigo “Modelo de Simulação Baseado em Agentes para Avaliar Política de Distribuição de Cargas Urbanas do E-Commerce”, que é parte das pesquisas da tese de doutorado. Recebeu o Prêmio Anpet de Produção Científica por apresentar o melhor estudo na área de Logística no 32º Congresso Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes e terá o trabalho publicado em edição especial da Revista Transportes, periódico técnico-científico nacional publicado pela Associação Nacional de Pesquisa e Ensino em Transportes (Anpet).
Em seus trabalhos, a pesquisadora faz simulações de entrega baseadas em agentes reais para a cidade de Belo Horizonte: clientes, lojas e transportadoras. Assim, consegue estimar custos, ganhos econômicos e ambientais com opções alternativas de distribuição dos produtos provenientes de compras online. É possível, inclusive, criar modelagens de logísticas que poderiam se repetir em outras situações ou localidades.
“Cada agente tem um objetivo diferente. O cliente quer receber rápido. A loja quer entregar com agilidade e pagar menos frete. Já a transportadora, deseja reduzir todos os custos”.
Para Roberta Alves, o lockers podem ajudar a todos os envolvidos no processo. “Buscamos validar todos os dados de distribuição junto a transportadoras. Os dados de clientes, a gente consegue pelo Ebit (site que mede a reputação das lojas virtuais por meio de pesquisas com consumidores reais). Avaliamos alguns cenários com o uso do locker em BH e vimos que há um ganho imenso na consolidação das entregas.
Sustentabilidade
As investigações de Renata Alves são desenvolvidas dentro do Grupo de Pesquisa em Logística, Transportes e Sustentabilidade (LogTranS), da Unifei, sob orientação o professor Renato da Silva Lima. O grupo existe desde 2003, mas há oito anos tem o foco na sustentabilidade.
“Afinal, o que é esta logística urbana sustentável? Uma das opções é trocar veículos que rodam com combustíveis fósseis por elétricos, o que se configura como um ponto de vista mais óbvio para redução de emissão de poluentes. Mas, há outro aspecto menos óbvio que é a diminuição dos veículos em distribuição. Quando a logística de entrega do comércio eletrônico gera um número de viagens menor, está contribuindo para menos poluição e congestionamento. Devolve a cidade para as pessoas”, explica o professor Renato Lima.
Há outros cenários de sustentabilidade como a entrega por bicicletas e drones, mas todos carecem de regulamentação. A chave para os pesquisadores e profissionais de logística é equilibrar um paradoxo moderno:
“O ser humano urbano é a pessoa que não quer ir à loja comprar, porque prefere receber em casa. No entanto, reclama do tráfego da cidade, mas grande parte desse trânsito é gerado pela distribuição de compras que ele faz”, conclui o professor.
Colaboram com os trabalhos no LogTranS: Leise Leise Kelli de Oliveira, do Departamento de Engenharia de Transportes e Geotecnia da UFMG; Alexandre Ferreira de Pinho, da Unifei; Jose Holguin-Veras, Diretor Centro de Excelência em Sistemas de Transporte Urbano Sustentável da Volvo Research and Educational Foundations, no Rensselaer Polytechnic Institute, New York (EUA).
Desafios das pesquisas
Há muitos pesquisadores dedicados ao tema City Logistics, pensando em integrar atores do meio ambiente urbano, cidadão e políticas públicas, conforme apontou Renato Lima. No Brasil, entretanto, o desafio é a falta de conexão com o mercado. Ele esteve em Nova York para estudos do pós-doutorado e percebeu o quanto as empresas de logística são parceiras das universidades.
“Em pesquisa estamos próximos do que é feito lá fora, mas a aplicação aqui é mais lenta”. Ele cita empresas como UPS e DHL que ajudam pesquisadores com fornecimento de dados reais da distribuição urbana.
Roberta Alves também apontou a dificuldade nos trabalhos que desenvolve. “Há pesquisas sendo engavetadas por causa da distância entre academia e mercado. Meu trabalho, apesar de ter potencial para chegar ao mercado, depende de mudança na cultura das empresas. Tive dificuldades em obter os dados, principalmente por parte de transportadoras”, conta.