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Vigilância Inteligente pode ser usada na detecção e contagem de pessoas. Imagem: Arquivo do pesquisador

Se lembra de algum filme em que reconhecimento facial, verificação de íris e imagens de câmeras de segurança são fundamentais para resolução de crimes ou servem para grandes heróis salvarem a humanidade dos perigos? Aposto que sim, porque é comum o cinema retratar as tecnologias em narrativas de ação e ficção científica.

Essas histórias estão cada vez mais inseridas no mundo real, muito além do que você pode imaginar. O grupo de pesquisadores do Laboratório Smart Sense, do Departamento de Ciências da Computação (DCC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), estuda e desenvolve sistemas de “Vigilância Inteligente”, que ajudam a extrair informações relevantes de imagens geradas por câmeras de segurança. São cerca de 20 pessoas envolvidas em projetos de pesquisa com foco em três elementos: vigilância, biometria e computação forense.

O coordenador, William Robson Schwartz, explica que a “Vigilância Inteligente” ajuda no trabalho de quem gerencia ou toma decisões a partir de sistemas de vigilância. Por exemplo: quando é necessário verificar imagens de segurança para identificar pessoas ou entender dinâmicas de um crime, o que se faz é coletar imagens armazenadas e analisá-las. Na “Vigilância Inteligente”, as informações são processadas durante a captura da cena e algoritmos filtram somente dados relevantes para o operador do sistema. Assim, potencializa o “olhar” dessa pessoa que não conseguiria acompanhar o tempo real de muitas câmeras, nem mesmo processar os dados manualmente.

Nesses contextos, os cientistas desenvolvem soluções para problemas que vão desde encontrar uma pessoa nas cenas de vídeo, rastrear, identificar, entender atividades realizadas, até entregar informações filtradas para quem precisa tomar decisões.

Os pesquisadores usam vídeos disponibilizados por outros grupos de pesquisa que coletam imagens em cenários reais, como shoppings. Utilizam também dados de projetos em parceira com empresas que demandam o trabalho da equipe Smart Sense para resolver problemas específicos. Ademais, criam seus próprios espaços de vigilância, como no caso do DCC.

“Temos câmeras que focam na parte interna do Departamento e a gente faz experimentos. Trabalhamos, por exemplo, o conceito de câmeras ativas em que são desenvolvidos algoritmos para rastrear pessoas no cenário. A pessoa nem percebe que a câmera está seguindo e num cenário real poderíamos usar esses mesmos algoritmos”, conta o professor.

As demandas que os pesquisadores recebem são de monitoramento e análise de vídeos. Imagine que o dono de uma loja queira saber em quais ambientes do estabelecimento circulam mais clientes. Com monitoramento visual, ele pode identificar são áreas de produtos mais atrativos, mostruários mais chamativos ou, apenas, zona de circulação. “O interesse não é controlar as pessoas, mas sim maximizar o lucro da empresa. O empresário pode colocar produtos onde as pessoas mais veem”, explica do professor.

No vídeo abaixo, você confere outros tipos de aplicações da “Vigilância Inteligente”. Até a repórter foi monitorada num sistema interno do DCC. (Imagem e edição: Rodrigo Patricios)

Vigilância: Big Brother da vida real

Aquela famosa frase da jornalista Glória Lopes, conhecida pelos mineiros, “se você não quer aparecer, não deixe que o fato aconteça”, vai precisar de uma nova versão. Algo como “se você não quer aparecer, não apareça” porque os sistemas de vigilância são, hoje, implacáveis na captura de atividades humanas. A ciência tem ajudado a torná-los ainda mais eficientes criando algoritmos que reduzem imprecisões. Se é necessário identificar alguém na cena, o cuidado será total para que não haja alarmes falsos como confundir um poste com uma pessoa e, assim, conferir credibilidade ao sistema.

Operadores de sistemas de vigilância estão, quase sempre, em busca de eventos fora do comum ou “eventos anômalos” nas cenas cotidianas. Segundo William Schwartz, os agentes principais da “Vigilância Inteligente” são as pessoas, atores que mudam o cenário. “O primeiro passo é detectar a pessoa, mas a entrega final é se a atividade dela é corriqueira ou anômala. Tem que separar aquilo que é suspeito e apontar para o operador: atenção para a pessoa que veste azul e aparece na câmera X”.

Pessoa pulando catraca pode ser exemplo de evento anômalo. Imagem: Arquivo do pesquisador

Mas, afinal, como os sistemas computacionais transformam imagem em dados? O professor explica que a imagem capturada é uma matriz de números. Os algoritmos são responsáveis por transformar esses números em representação que o computador vai identificar. “Quase sempre estamos focando em apresentar ao computador similaridades como: esta imagem é parecida com uma pessoa uma árvore? Esta face é da pessoa A ou B?”, exemplifica William Schwartz.

Ainda há espaço para pesquisas científicas sobre representação de imagens em vídeos, pois é um desafio trabalhar com essas informações, conforme explica o coordenador do laboratório. “Quando você tem uma foto, a informação é espacial, tem largura e altura do objeto. Nesse caso, tem os pixels para a representação. Em vídeo, tem altura e largura ao longo do tempo, ou seja, os pixels e a questão temporal estão juntos numa relação que não é trivial”.

Biometria: muito além das digitais

A biometria envolve as formas de identificação de pessoas em ambientes monitorados e vai muito além da digital dos dedos. A patela do seu joelho, assim como a forma como você anda são informações biométricas. “Uma câmera de segurança consegue identificar uma pessoa pela maneira como ela dá os passos”, afirma o professor.

Se há um sistema de segurança no qual somente pessoas autorizadas podem entrar num ambiente, é possível usar biometria.  Outro exemplo, conforme William Schwartz, é de aplicação em ambientes de trabalho. A equipe Smart Sense está desenvolvendo um sistema para a Petrobras em que será possível monitorar o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) pelos funcionários.

“Estamos criando algoritmos em sistema de vigilância para plataformas de petróleo. Não é para vigiar as pessoas em termos de situações suspeitas, mas sim monitorar o uso de EPIs. Se o colaborador entra em uma oficina sem luvas, protetor auricular ou capacete, será monitorado e identificado”, diz.

Nesse caso, os dados das câmeras vão para um servidor, um algoritmo é executado e gera informações para ao supervisor da oficina, que, em tempo real, saberá se está acontecendo um desvio nas normas de segurança.

O desafio da biometria em sistemas de vigilância é que ali as pessoas, quase nunca, estão disponíveis a ceder suas informações.  “Na vigilância, a gente assume que a pessoa está fazendo o que está fazendo, sem interferências, e tenta extrair a informação”, afirma o professor. Segundo ele, é diferente de alguém ceder o DNA para um teste de identificação. Em ambiente monitorado, não há colaboração da pessoa que precisa ser reconhecida.

Quando você vai ao banco, insere o cartão em uma máquina ou informa o número da conta, o uso a biometria por meio da digital vai apenas verificar sua identidade. “Você já falou quem é você. O sistema já sabe que só existe uma pessoa com aqueles dados, por isso apenas confirma sua digital. Seria totalmente diferente se você colocasse a digital sem dar outra informação. O sistema teria que buscar na base de milhões de clientes quem é o dono daquela digital. Identificar um para um é mais fácil. Quando é um para muitos, fica mais complicado”

O reconhecimento de faces também é biometria. Nesse caso, o desafio é a mudança que um rosto pode ter ao longo do tempo, com marcas, cicatrizes ou uso de barba. “Quando você tem uma lista de pessoas que vai monitorar, ou seja, um banco de dados com conhecidos, todas as outras que aparecem na imagem serão descartadas. Se aplicarmos isso num aeroporto, seria feito em duas etapas: verificar se a pessoa está na lista e, se estiver, saber quem é. Isso chamamos de watch list”, ensina William Schwartz.  Caso não exista uma lista de pessoas, o sistema fará uma busca em “galeria aberta”, que é bem mais complexa.

Computação Forense: crimes x tecnologia

A extração de conhecimento em imagens de câmeras de segurança pode ser grande aliada na resolução de crimes. Pode ajudar no reconhecimento de placas de carros ou identificação de pessoas suspeitas. Se alguém entra em um prédio com sistema de vigilância instalado, é possível rastrear, descobrir ações suspeitas, mostrar com que conversou e apontar todas as atividades realizadas.

“Dado que aconteceu um crime, por exemplo, e quero encontrar evidências, é possível pelas imagens olhar o que aconteceu. Manualmente, iremos verificar os dados armazenados pelas câmeras. A Vigilância Inteligente faz um processamento automático dos dados”, explica o professor.

Vigilância Inteligente pode ser usada na identificação de placas difíceis de reconhecer. Imagem: Arquivo do pesquisador

Também é possível fazer reconhecimento de placas em tempo real, conforme William Schwartz. “Imagine que um carro passa em alta velocidade, é detectado por uma câmera de vigilância e acontece um crime ali perto. Conseguimos criar métodos para ver a placa, por mais que os olhos humanos não consigam distinguir. Trabalhamos com placas difíceis de reconhecer, usando método de deep learning. O sistema identifica nuances nas letras da placa, que o homem não consegue ver”. Dessa forma, a computação pode ajudar em investigações policiais.

E o papel da computação vai até onde? Segundo o professor, o objetivo é sempre extrair a informação visual, processar e entregar aos responsáveis. “Não é substituir os operadores do sistema de vigilância, mas auxiliá-los. A ideia não é automatizar tudo e colocar um robozinho para tomar decisão”.

Luana Cruz

Mãe de gêmeos, doutoranda e mestre em Estudos de Linguagens pelo Cefet-MG. Jornalista graduada pela PUC Minas. É professora em cursos de graduação e pós-graduação.

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