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Por que acreditamos em notícias falsas?

“Por que a gente acredita nisso?”. Yurij Castelfranchi, professor do Departamento de Sociologia da UFMG, dirigiu a pergunta ao público nesta quinta-feira, em palestra no Festival de Verão da UFMG. O físico, sociólogo e ex-jornalista debateu ciências, crenças, controvérsias e notícias falsas.

Para Castelfranchi, todos nós somos vítimas das chamadas fake news. “Porque o problema nunca é apenas falta de informação. O problema é, antes de tudo, poder, política e relações sociais. Não é a falta de informação que faz com que pessoas neguem genocídio, acreditem que a terra é plana ou que sejam racistas, homofóbicas ou transfóbicas”, afirmou.

Na palestra, o sociólogo falou sobre o que acontece quando discussões são atravessadas por argumentos científicos. A ciência ocupa papel fundamental na construção de controvérsias de cunho político ou de valores. “Se vocês falam em mudança climática, ideologia de gênero ou se um político deveria ser afastado, as falas vão recair em questões técnicas”, disse.

A mentira e a ciência

Medidas políticas relacionadas ao aquecimento global ou a políticas públicas de saúde são exemplos de decisões sociotécnicas sustentadas – ou que fingem se embasar – por elementos técnico-científicos. E, segundo o professor Yurij Castelfranchi, acontecem em ambiente extremamente midiatizado, enquadradas por temas e contextos específicos e que pautam a agenda do que consideramos importante. Quase sempre atravessadas por uma construção social de risco.

“Uma das facetas disso é o sensacionalismo. E pode ter um impacto social e de saúde dramático”, afirmou o sociólogo. O professor trouxe o exemplo da recente rejeição a vacinas na Europa: uma controvérsia política embasada por informações técnicas, números e gráficos.

Além do sensacionalismo e da escolha de dados específicos que dão razão a um dos lados da discussão, a polêmica é alimentada por notícias falsas. “O tipo de imaginário emocional usado costuma ser violento. São armas imagéticas que, por exemplo, relacionam vacina a nazismo, porque nazistas também se vacinavam. Argumentos fake que se alimentam, reconstroem e reproduzem preconceitos. E os usam para construiu uma lógica que não existe realmente”, disse.

Comerciantes da dúvida

O sentimento de incerteza, de polêmica e de que os cientistas não conseguem decidir também são armas na disseminação de controvérsias que levam à indefinição ou ao atraso político. “Você não precisa mentir. É suficiente você diluir a atenção das pessoas sobre o problema, para mostrar que não é tão importante. E construir controvérsia em cima da controvérsia cria uma incerteza falsamente científica”, explicou Castelfranchi.

O professor apresentou a estratégia adotada por anos pela indústria do tabaco, com financiamento a pesquisas sobre o câncer, originado por fatores diversos ao cigarro, e pagamento a jornalistas para publicar os resultados. São medidas relacionadas a:

Produção enviesada – mostram apenas evidências contra uma teoria. Por exemplo, focar nos poucos artigos existentes que negam a relação entre cigarro e aumento do risco de câncer.

Compartilhamento seletivo – mostram outros fenômenos que diluem os fatos ou distraem. Por exemplo, publicar artigos sobre câncer de pulmão relacionado a amianto ou poluição atmosférica.

Fatos e artefatos

Segundo Castelfranchi, pode-se definir as mentiras em três categorias:

Mentiras egoístas – Aquelas que usamos para negar, explicar ou justificar ações próprias, e que aprendemos a partir dos três anos de idade;

Mentiras altruístas – Mentiras feitas para não decepcionar o outro;

Mentiras azuis – São simultaneamente egoístas e altruístas. Não são usadas para defender a si mesmo, mas um grupo – às vezes se comprometendo, outras comprometendo o outro, um fator externo.

“Tem algo muito interessante por trás das mentiras, que não é sobre a verdade ou a não verdade, mas sobre como elas funcionam na esfera social”, comentou o professor. Ele explica que se uma mentira coloca a pessoa em uma boa posição no grupo ao qual pertence, mesmo se ela for desmascarada, ela não é negada.

Assim, as pessoas não compram uma mentira por ignorância, mas em função de como ela fortalece a convicção de estar certo. Para Castelfranchi, “as pessoas não mudam de ideia, mas se posicionam contra quem aponta a mentira. Elas têm um efeito de coesão social tão forte que não adianta mostrar que a pessoa está errada”.

O efeito desse comportamento nas redes sociais, é que as bolhas nas quais os indivíduos se inserem amplificam esse tipo de sentimento e o ódio ao outro. E, da mesma forma, se uma informação vem de uma fonte que é desacreditada por um grupo, ela não é lida como válida. “É um funcionamento bastante ampliado. As nossas crenças precisam ser alimentadas, seja por fatos ou artefatos”, afirmou.

Como identificar notícias falsas?

Confira dicas do professor Yurij Castelfranchi para identificar notícias falsas:

• Considere a fonte;

• Leia mais;

• Verifique o autor;

• Verifique fontes de apoio;

• Verifique a data de publicação;

• Confira se é uma piada;

• Pergunte-se se é um preconceito;

• Consulte um especialista;

• Tenha cuidado com os números, eles podem enganar;

• Desconfie muito mais das informações com as quais você concorda;

• Assuma que sua escolha é uma escolha.

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