Quando se comparam fotos de quando Barack Obama, ao assumir a Casa Branca, em 2009, e ao sair, em 2017, certa característica chama bastante atenção: a enorme quantidade de cabelos brancos adquirida pelo ex-presidente americano em tal período, à frente, como se sabe, de um dos postos mais importantes (e complexos) do mundo. Trata-se de responsabilidade gigantesca, que, sem dúvida, gera altos níveis de tensão e estresse no dia a dia.
No que diz respeito, especificamente, aos fios embranquecidos, sabe-se, hoje, que muitos fatores são responsáveis pela mudança de cor dos cabelos, a exemplo do próprio envelhecimento ou da carga genética – que o digam os jovens precocemente grisalhos. Para além de tudo isso, porém, o estresse sempre aparece – segundo crenças populares – como causa para aceleração de tonalidade das madeixas. O que diz a ciência sobre a questão, afinal?
Antes de entrar de modo direto na discussão, vale a pena lembrar que, cientificamente, o embranquecimento dos fios é chamado de “canície”. Tal fenômeno é tido como consequência natural do processo de envelhecimento, e, geralmente, começa a partir dos 35 anos, ligado à queda da produção de melanina, substância responsável pela cor da pele e do cabelo.
Com relação aos efeitos do estresse, a discussão é outra! Quem nunca já escutou dos pais que muita preocupação deixaria os cabelos brancos? A máxima popular, confirmada por muitos segundo suas próprias “experiências empíricas”, também pode ser comprovada por estudos biológicos? Quais, exatamente, as moléculas e células envolvidas no fenômeno?
Pesquisa de doutorado realizada junto ao programa de pós-graduação em Biologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) chamou a atenção sobre o tema. O estudo buscava compreender o mecanismo da manutenção de dores, mesmo após a resolução das respostas inflamatórias, em camundongos. Para além do objetivo central, observou-se que os pelos dos camundongos embranqueciam quando o sistema sensorial era ativado. O seja: diante de situação estressante, havia, mesmo, alteração na cor da pelagem dos pequenos mamíferos.
Segundo William Antonio Gonçalves – hoje, doutor em Biologia Celular, e, à época da pesquisa, responsável pelo projeto –, pretendia descobrir como a dor dos animais permanecia, mesmo após o término da inflamação articular, observada no modelo de artrite induzida por antígeno, modelo experimental realizado em camundongos, que mimetiza a inflamação observada em pacientes com artrite reumatoide.
Para responder a pergunta, Gonçalves precisava de uma ferramenta – a resiniferatoxina (RTX) – capaz de eliminar os neurônios sensoriais responsáveis por “perceber” o estímulo doloroso. Porém, o que ele não esperava era que o pelo dos camundongos ficasseem brancos depois de alguns dias, após o tratamento com a RTX. “Percebi que havia outra pergunta que não deveria ser ignorada. Por que o pelo dos animais embranquecia depois que eu eliminava as células sensoriais da dor com a RTX?”, resume.
Assim, ao perceber o fenômeno dos pelos brancos nos camundongos, William foi estimulado por sua orientadora, a professora Vanessa Pinho, a investir na pesquisa paralela, ao desenvolver novos experimentos junto a um dos coorientadores do doutorado, o professor Thiago Cunha, da Universidade de São Paulo de Ribeirão Preto (USP-RP), que havia fornecido a RTX .
Os dois decidiram conversar com outros grupos, que também trabalhavam com a RTX, e descobriram que William Gonçalves não foi o primeiro a fazer tal constatação. “Pesquisadores do grupo da professora Ya-Chieh Hsu, de Harvard, haviam verificado o mesmo fenômeno, e estavam com trabalhos relativamente avançados”, conta o professor, ao reforçar, no entanto, que os norte-americanos precisavam de evidências para responder como o estresse provocado pelo uso da RTX – algo que não se sabia que acontecia e havia sido padronizado por eles – influenciava a alteração de cor na pelagem dos camundongos. Com tal intuito, os especialistas brasileiros começaram seus experimentos.