O câncer ainda representa um problema de saúde para o brasileiro. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o país deverá registrar 625 mil novos casos por ano de 2020 a 2022. Dessa forma, descobrir novas maneiras de diagnostica-lo e trata-lo é fundamental para auxiliar os pacientes.
Pensando nisso, um grupo de pesquisadores do departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, apoiado pela FAPEMIG estuda, há cerca de três anos, como o sistema nervoso se comporta frente ao desenvolvimento de tumores. O grupo também verifica como a presença, ou ausência, desses nervos pode afetar o câncer.
De acordo com o biomédico e coordenador da pesquisa, Alexander Birbrair, o estudo investiga tumores bastante incidentes na população brasileira, como melanoma, próstata e mama. “Buscamos compreender uma pergunta fundamental: será que o sistema nervoso controla o câncer?”.
A pesquisa, publicada no Journal of Cellular and Molecular Medicine, demonstrou que os nervos sensoriais são capazes de infiltrar o microambiente formado pelo melanoma. Uma vez dentro do tumor, os nervos controlam seu crescimento, reduzindo a formação de vasos sanguíneos.
“Isso aumenta a sua morte celular e reduz sua proliferação, resultando em tumores menores”, conta Birbrair.
O pesquisador explica, ainda, que quando os nervos são deixados sem função foi observado que esse controle é perdido. O que acaba ocasionando tumores maiores e mais agressivos.
Além da FAPEMIG os pesquisadores contam com o apoio do Instituto Serrapilheira, Capes e CNPq. “Temos, ainda, a colaboração de pesquisadores vinculados a outros departamentos do ICB e de outras instituições brasileira como a Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Assim, como a colaboração internacional da Columbia University de Nova Iorque”, informa.
DESCOBERTA
Birbrair explica que, para verificar os efeitos do sistema nervoso nos tumores, foram utilizados camundongos, divididos em dois grupos, como modelo experimental. O primeiro grupo era de animais transgênicos – que já nascem sem os nervos sensoriais – e o segundo foi tratado com um composto de Resiniferatoxina (RTX), fármaco que leva à perda da função desses nervos.
Segundo o coordenador, os modelos receberam células de melanoma e, a partir daí, os pesquisadores analisaram como esses tumores cresciam e como estavam os vasos sanguíneos, importantes para nutrição, crescimento e disseminação do tumor. Além de investigar como as células de câncer são afetadas dentro dos tumores.
“O crescimento in vivo das células tumorais foi acelerado após a eliminação genética e farmacológica desses nervos, indicando que as inervações sensoriais tentam neutralizar a progressão do melanoma”, informa o pesquisador.
INOVAÇÃO
Os tumores são formados por massas de células malignas associadas a outras células que influenciam seu crescimento. Atualmente terapias, como a imunoterapia, buscam usar células que já estão no microambiente formado pelo tumor como forma de combatê-lo.
Segundo Birbrair, a presença e função desses nervos sensoriais no melanoma indicam a possibilidade de que, no futuro, eles possam ser usados como uma nova terapia antitumoral. “Imagine controlar um tumor, de dentro dele, de forma que ele promova a própria extinção?”.
O biomédico informa, ainda, que algumas quimioterapias atuais causam danos aos nervos. “Compreendendo o papel dos nervos sensoriais entenderemos melhor como esse efeito colateral pode afetar o comportamento do tumor. Estamos também estudando fatores dos nervos que pioram a sobrevida dos pacientes e o sucesso da terapia”, destaca.
PRÓXIMOS PASSOS
Apesar de iniciais, as descobertas da pesquisa trazem contribuições que podem se tornar relevantes para o tratamento dos diversos tipos de câncer. Além de poder embasar o desenvolvimento de métodos e tratamentos menos invasivos de combate aos tumores.
Atualmente, o grupo trabalha em descrever quais mecanismos celulares e moleculares estão envolvidos no controle que os nervos sensoriais exercem no desenvolvimento do melanoma. Segundo Birbrair, o foco nessa nova fase é avaliar como a modulação dos nervos, ao contrário de uma ausência total, altera o comportamento do tumor.
“Além de avaliar como células imunes, células tronco cancerígenas e a formação de metástase são alteradas quando manipulamos o sistema nervoso”, informa o coordenador do estudo.
ABRINDO PORTAS
O melanoma é altamente incidente na população brasileira e gera grandes custos ao SUS, com tratamentos, diagnósticos, cirurgias e leitos. “O paciente pode passar longos períodos em tratamento, longe da família e afastados do seu trabalho, às vezes nem conseguindo retornar a ele após o tratamento”, pontua.
Nessa perspectiva a pesquisa visa estabelecer uma nova abordagem terapêutica, que faria o paciente ter uma melhora, significativamente, mais rápida e com menos efeitos colaterais. Permitindo a redução dos impactos gerados pela ausência familiar e no trabalho do paciente.
Para Alexander Birbrair esse estudo pode, ainda, abrir portas para descoberta de marcadores específicos associados ao sistema neural. “Nos levando a um novo entendimento sobre a prevenção do melanoma que, aliado aos conhecimentos já estabelecidos, poderá reduzir a incidência e a mortalidade desse tipo de tumor na nossa sociedade”, destaca.