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Imagem ilustrativa. Foto: Pixabay

A finitude da existência é uma das poucas certezas da humanidade. A emoção relacionada à morte, entretanto, apresenta-se como fenômeno subjetivo, atrelado a contextos socio-históricos. Ou seja, muitos não sabem lidar com “o fim”, mesmo cientes de sua inevitabilidade. Tal dificuldade, aliás, não é problema exclusivo de quem perde entes queridos. O dilema atinge, também, a comunidade médica, cujo propósito reside nos cuidados com a vida humana e a quem cabe o difícil papel de comunicar, a familiares e amigos, as piores notícias.

Nos hospitais de emergência, por exemplo, embora a morte seja um evento frequente, devido à gravidade dos casos atendidos, os médicos percebem a vivência de comunicá-la como uma das mais árduas tarefas de seu fazer profissional. Isso acontece porque a função vem acompanhada por dificuldades éticas e políticas, ambiguidades e falta de preparo com o tema.

Tal dificuldade cotidiana da comunidade médica inspirou a psicóloga Gislaine Alves de Souza, doutoranda em Saúde Coletiva pelo Instituto René Rachou – Fiocruz Minas, a desenvolver a dissertação de mestrado “Comunicar a morte em um hospital de emergência: a significação da experiência na percepção do médico”. Com especialização em programa de residência integrada multiprofissional em saúde do idoso, a maior parte de sua carga horária deu-se na assistência hospitalar.

“No mestrado, elegi como proposta aprimorar e aprofundar os estudos sobre a comunicação da morte em um hospital de emergência.Devido ao impacto do fenômeno nos envolvidos, e às implicações no cotidiano da assistência à saúde, interessei-me por discutir a temática”, explica.

Análise de dados

 Além de inquirir o modo como os médicos lidam com a necessidade de comunicar o falecimento de pacientes às famílias, a pesquisa buscou compreender as relações do médico com os limites entre vida e morte. O estudo de Gislaine de Souza, afinal, integrou projeto mais amplo da Fiocruz, intitulado “Vidas em risco: uma abordagem antropológica sobre as representações da morte entre médicos que trabalham em setores de urgência”.

Dessa forma, o primeiro passo da investigação foi a coleta de dados, por meio da etnografia, realizada pela antropóloga Janaína de Souza Aredes. Durante nove meses, ela entrevistou e acompanhou 43 médicos que atuavam junto a pacientes graves, com risco de morte. Por ser referência em alta complexidade traumato-ortopédica, o Hospital João XXIII foi escolhido como local para coleta dos dados.

“Com o intuito de compreender o contexto em que os dados da etnografia foram coletados e produzidos, também realizei visita técnica ao hospital. Após a leitura exaustiva das entrevistas e do diário de campo, iniciei a categorização dos dados de interesse para o estudo, assim como as análises. A pesquisa foi desenvolvida segundo a abordagem qualitativa guiada pela Antropologia Interpretativa”, detalha Gislaine de Souza.

A análise dos dados coletados mostrou que   a relação com a família, usualmente, é rápida e impessoal. Além disso, a comunicação ocorre sem conversas prévias, de maneira a conciliar a atenção aos parentes à própria dinâmica das emergências. Observou-se que, mesmo com a existência de diretrizes que apontam formas de comunicar a morte, os médicos não as seguem, uma vez que anunciam o falecimento de modo indireto, com uso de eufemismos e metáforas.

Em outros termos, eles fazem uso de mecanismos defensivos, enfatizam a gravidade clínica e informam, progressivamente, sobre o agravamento do quadro, para que a morte seja aguardada pela família e se encaixe na rotina da emergência.

“Trata-se de comunicação pensada nos moldes do modelo informacional, mas que, na prática, é dinâmica e traz à tona significados envoltos por aspectos afetivos e socioculturais. Via de regra, a morte é interpretada como adversidade: o pior desfecho, a má notícia”, comenta.

Quer entender a contradição entre a fala e a ação dos médicos na hora de comunicar a morte? Leia na reportagem da revista Minas Faz Ciência edição 79.

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