O Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG) inaugurou na semana passada uma competição muito diferente. Artistas se enfrentam num campeonato de poesia que resgata raízes na cultura do hip hop, rap e funk. São as sessões de Slam, prática que surgiu nos anos de 1980 em Chicago, Estados Unidos, e chegou ao Brasil nos anos 2000. Para ficar ainda mais diferentão, o Slam do CEFET tem como tema a ciência.
A primeira batalha do Slam Científico contou com as poetas Yasmim, Eliza, Capitú, Abelha e Anarvore.
A sessão é de arrepiar, tem muita poesia falada com uso da voz e do corpo. De acordo com a professora Cláudia França, responsável pelo projeto, a ideia é trazer uma prática social para a academia. Ela desenvolve há três anos trabalhos nas comunidades belo-horizontinas Cabana do Pai Tomás e Serra, em um programa de extensão do CEFET. Assim, convive semanalmente com moradores e artistas que despontam com uma linguagem de resistência.
“Comecei a desenvolver raps científicos e temos hoje 10 composições para gravar um CD. Tive contato com as comunidades que são julgadas nos espaços acadêmicos e de elite. Não sou do meio da poesia, nem mesmo do Slam. No entanto, vi que isso poderia dar uma boa pegada com ciência. Conheci o Slam, pesquisei sobre o assunto e propus essa prática cultural como divulgação científica”, conta.
Um pouco de história…
O Slam atualmente conta com campeonatos consolidados, principalmente em São Paulo, como o Zona Autônoma da Palavra, o Slam Interescolar e o Slam da Guilhermina.
“Comecei a pesquisar o Slam sem nunca ter ido a uma sessão. Agora, eu frequento o Slam Clube da Luta do grupo de Teatro Espanca, em BH. Fui também a uma oficina de Slam em São Paulo, ofertada pelo grupo Slam das Minas. São duas meninas de classe média e duas mulheres negras de periferia envolvidas num projeto para divulgar a poesia nas ruas e estações de metrô. Uma dessas integrantes foi campeã do Slam BR, campeonato brasileiro, e foi para a Copa do Mundo em Paris”, relata Cláudia França.
O Slam BR teve a primeira edição em 2014 promovido pela companhia de teatro hip-hop Núcleo Bartolomeu de Depoimentos. A competição reuniu participantes de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Em 2016, já eram 29 competidores, de cinco estados.
Quando entra a ciência…
Em 2006, estudantes de pós-graduação na Alemanha criaram o ScienceSlam, como forma de divulgar experiências e descobertas científicas de maneira mais “relaxada e dinâmica”. Esse formato de popularização da ciência já foi adotado em países como Estados Unidos, Rússia e Reino Unido.
Em 2018, o Brasil teve o Science Slam, concurso de comunicação científica organizado pela EURAXESS, comissão europeia que conecta pesquisadores do Brasil e de outros países da América Latina com a Europa. Conheçam a vencedora:
Para a professora Cláudia Franca, popularizar ciência por meio do diálogo entre práticas culturais correntes das comunidades e o conhecimento científico que se constrói nos espaços acadêmicos estimula a criatividade e estreita laços entre instituições de ensino e a sociedade.
No caso do CEFET, a proposta para o primeiro Slam foi abordar temas polêmicos da ciência como atividades mineradoras, mudanças climáticas, aborto, feminicídio, escola e educação. A batalha aconteceu no hall do restaurante do campus I.
Como funciona?
A batalha tem jurados, notas, regras, Slammaster (mestre de cerimônias) e tudo que envolve um típico campeonato. “É uma cena própria”, caracteriza a professora Cláudia França.
Na sessão do CEFET, os jurados deram notas de 1,1 a 10,0. Os artistas tiveram três minutos para recitar poesia em duas rodadas. Ao todo, seis poetas protagonizaram 90 minutos de muita arte e ciência. Eles foram avaliados por professores, alunos e técnicos administrativos do CEFET que compuseram a “banca”. A grande campeã foi a poeta Capitu.
Projeto Slam Científico
A primeira sessão inaugurou no CEFET o projeto que ainda contará com outras ações. Haverá oficinas com as seguintes temáticas: História do Slam; Ciência e Poesia; Práticas Poéticas; Poesia, Corpo e Voz; além de outra atividade ofertada por professores do Departamento de Linguagens e Tecnologias da instituição.
As inscrições para as oficinas estão abertas. A primeira, sobre História do Slam, contará com a presença da poeta Luz Ribeiro, finalista da Copa do Mundo de Slam, em Paris. A oficina acontecerá no dia 9 de maio, com exibição do documentário “Slam, voz de levante”, Miração Filmes, 2017.
De acordo com a professora Cláudia França, a próxima sessão de Slam Científico deve ocorrer em maio. Os envolvidos no projeto esperam que os eventos promovam espaços de diálogo, por meio da ciência, entre o CEFET-MG e a sociedade, de forma horizontal e acolhedora, que reconheça e respeite práticas culturais.