Quando falamos em robô, o que vem à sua mente? Aqueles humanoides que obedecem aos comandos? É hora de repensar esta ideia porque a robótica vai além das imagens construídas nos filmes de ficção científica. Os robôs estão, por exemplo, nos hospitais ajudando médicos em cirurgias e fazendo parte de procedimentos complexos para salvar vidas.
A cirurgia robótica é uma realidade na medicina. “Um caminho sem volta, que eu costumo comparar com o carro elétrico. Está caro, ainda temos pouco acesso, mas é algo que veio para ficar”, afirma o ginecologista da Rede Mater Dei e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Agnaldo Lopes.
De acordo com o médico, o uso dessa tecnologia representa o que há de mais avançado no campo da cirurgia minimamente invasiva. Permite alta precisão, possibilita recuperação mais rápida, menor tempo de internação e reduz a taxa de complicação em pacientes. Nesse procedimento, o médico usa um console do sistema robótico, com visualização tridimensional, alta definição e ampliação da imagem, facilitando a compreensão da anatomia cirúrgica.
A cirurgia robótica começou nos Estados Unidos por causa de uma necessidade prática e tática, conforme explica o Agnaldo Lopes. “Era preciso operar soldados no front de batalha”, afirma. Um procedimento que marcou a história foi feito, em 2001, com médicos à distância: parte da equipe estava em Nova York e outra, na França, para operar um militar. A partir daí, a tecnologia começou a disseminar.
Segundo o médico, a legislação obriga a presença de um cirurgião na mesma sala que o paciente. O robô é, na verdade, um avanço à técnica de laparoscopia, que faz pequenas incisões para entrada de um tubo bem fino com uma câmera responsável por transmitir a um monitor imagens do interior do corpo. “Todo o controle, mesmo na cirurgia robótica, continua sendo do cirurgião, mas nesse caso, há mais segurança no procedimento”, explica.
Os médicos que realizam o procedimento passam por treinamentos fora do Brasil e precisam de certificações. “O cirurgião faz provas e tem que passar por capacitação em simuladores. Depois, opera com a presença de um tutor, só então, é liberado para fazer os procedimentos com autonomia”, detalha Agnaldo Lopes.
No mundo, há cerca de 3 mil robôs usados em cirurgias
O Brasil tem aproximadamente 40 robôs espalhados em São Paulo, Rio, Recife, Fortaleza, além de Belo Horizonte e Grande BH onde há 3 equipamentos
Aplicações
A cirurgia robótica é comum em várias aplicações: urologia, ginecologia, cirurgia torácica, coloproctologia, procedimentos em pacientes com câncer, nas reduções de estômago, entre outras.
O robô Da Vinci XI, da Rede Mater Dei, é um dos equipamentos usados em Belo Horizonte. Se tornou um diferencial em cirurgias oncológicas. No caso de câncer ginecológico, por exemplo, é possível identificar tumores em tempo real por meio de uma tecnologia de infravermelho: o Firefly. A imagem fluorescente permite que os cirurgiões tenham uma visão minuciosa, avaliem melhor a anatomia de vasos e estruturas, além de possibilitar uma pesquisa mais precisa de linfonodos.
Quando o assunto é câncer de próstata, a cirurgia robótica reduz o risco de sequelas como incontinência urinária e impotência. De acordo com a Fundação Educacional Lucas Machado (Feluma), há pacientes que recebem alta hospitalar com menos de 24 horas de internação, quando o normal é, no mínimo, dois dias. Os hospitais parceiros da rede Feluma – Vila da Serra e Felício Rocho, realizaram 600 cirurgias robótica em dois anos, sendo 357 (59,5%) para tratamento do câncer de próstata.
Saúde pública
A tendência é o uso de robôs em procedimentos cirúrgicos se espalhar, chegando ao Sistema Único de Saúde (SUS), mas isso ainda não é uma realidade. “Tem que criar possibilidade de disseminação, no entanto o custo do robô ainda é um empecilho”, destaca Agnaldo Lopes.
Atualmente, o Ministério da Saúde oferece incentivos fiscais para projetos que utilizem a tecnologia robótica, pelos programas de Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS) e Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon), feitos por entidades filantrópicas credenciadas. Conforme Agnaldo Lopes, somente o Hospital de Câncer de Barretos e o Instituto Nacional do Câncer (INCA), no Rio de Janeiro, atendem com cirurgia robótica pelo SUS.
No âmbito das pesquisas, Agnaldo Lopes avalia que a Universidade Campinas (Unicamp) e a Universidade de São Paulo (USP) – por meio da Policlínica IESEP – estão bastante envolvidas nos estudos sobre cirurgia robótica. Talvez sejam as mais adiantadas na possibilidade de desenvolver tecnologias brasileiras para a área.
Algoritmos
O professor e pesquisador Bruno Vilhena Adorno, do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG, participa, desde 2017, de uma pesquisa em conjunto com a Universidade de Tóquio sobre controle de robôs para aplicações cirúrgicas. Recentemente, Adorno desenvolveu algoritmos que norteiam o funcionamento “inteligente” de robôs-cirurgiões.
Em maio deste ano, a equipe da Universidade de Tóquio apresentou, durante a International Conference on Robotics and Automation (ICRA/2018), realizada na Austrália pelo Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), um sistema que possibilita, por exemplo, operar o interior do tórax de fetos sem risco de quebrar costelas ou danificar tecidos. Adorno participou do desenvolvimento do software para o robô montado pelos pesquisadores japoneses.
De acordo com o professor da UFMG, ideias para projetos em robótica surgem de modelos matemáticos, ou seja, conjuntos de equações que regem o funcionamento dos sistemas e se traduzem em um programa de computador.
No caso da operação robotizada, o médico manuseia alavancas em uma plataforma à parte, que funciona como extensão de seu corpo. Esse sistema “inteligente” interpreta os movimentos do médico com bastante precisão, o que possibilita o uso de técnicas para anular ruídos, como os tremores naturais das mãos.
(Com informações da assessoria de comunicação da UFMG)