Consultório aberto: cérebro, depressão e medicamentos

Um pianista toca uma música. Outro, apenas escuta e imagina fazer o mesmo. A análise das ondas cerebrais de ambos pode revelar que eles experimentam sensações semelhantes. Com essa imagem, o médico Eduardo Tavares, professor aposentado da Faculdade de Medicina da UFMG, ilustra o potencial da imaginação. “Nosso cérebro constrói o que queremos ver”, resume.

Depois de desvendar truques de mágica baseados em ilusão de ótica, Eduardo arrancou aplausos na noite dessa terça-feira, 15, no restaurante Dona Fulô, num dos encontros promovidos pelo Pint of Science em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A cidade recebe o evento pela primeira vez em 2018 (confira a programação), por mobilização da Incubadora Ideias, da PUC Minas.

Dentre outros assuntos, o professor também falou da importância do contexto: quando alguém está triste, por exemplo, há uma tendência de valorizar aspectos negativos daquilo que se passa ao seu redor.

“As coisas não são o que parecem”, reforçou Renato Silveira, psiquiatra e docente do curso de Medicina da PUC. Em sua apresentação, na sequência, ele ressaltou a tendência que as pessoas têm, hoje, de confundir tristeza e depressão. “Depressão é uma doença. Tristeza é um sentimento humano”, comparou. Sem minimizar a importância do quadro depressivo genuíno, o psiquiatra criticou os atuais critérios diagnósticos. Ele citou a extensa lista da Classificação Internacional de Doenças (CID), que inclui até mesmo o luto como uma patologia.

Sem remédio

Para Renato Silveira, essa confusão gerou um “problema de saúde pública no Brasil”: a prescrição exagerada de medicamentos. Ele lembrou que, na década de 1990, a fluoxetina foi apresentada como “a droga da felicidade”, que também ajudaria a emagrecer. “O remédio é importante, se for bem indicado. Mas não como aditivo à vida, para estarmos sempre felizes”, alertou.

Segundo o especialista, a pílula da vez é a ritalina, indicada para o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

“Oitenta por cento das pessoas que tomam não têm [a doença]; como muitos estudantes de Medicina, para ‘passar no vestibular´”, relatou. O resultado do uso abusivo, nesse caso, é a produção de um estado de atenção concentrada, acompanhado de “baixa vigilância”, ou seja, de uma capacidade reduzida de percepção para outras situações. “A pessoa decora, mas não aprende”, explicou.

O médico enfatizou a importância do acompanhamento profissional na administração dos medicamentos. “O bom psiquiatra não só prescreve, mas também retira o remédio quando não é necessário. Tem hora para começar e para terminar”, disse. A apresentação acabou em clima descontraído. “A serotonina [substância associada à sensação de prazer] foi ativada em vocês? E eu não usei remédio nenhum”, brincou.

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