Os muros da cidade contam a história daquele local. Na paisagem urbana, as inscrições observadas nas fachadas de construções diversas dão voz a uma população geralmente marginalizada pelo senso comum. Mais do que rabiscos na parede, a pixação − embora nos dicionários o termo seja grafado com “ch”, nas ruas, na linguagem dos pixadores e na pesquisa em questão o termo é escrito com “x”− é algo que diz sobre um modo de vida, sobre vida em comunidade e sobre apropriação do espaço urbano.
A dissertação de mestrado do pesquisador Álan Pires intitulada “Escritas Urbanas e apropriação da cidade: o sujeito como formador do cenário urbano” aborda a importância da pixação para a história de Belo Horizonte. Sob a orientação de Regina Helena Silva, professora da Universidade Federal de Minas Gerais, a pesquisa do Departamento de História da Universidade apresenta uma abordagem da trajetória da pixação em BH, destacando as mudanças ocorridas ao longo do tempo.
“Trata-se de uma escrita que flerta com movimentos sociais e de organização política. Da ditadura militar ao dias atuais, essa escrita foi ganhando um corpo próprio passando por mudanças em suas formas, regras e maneiras de se organizar. Durante alguns anos a pixação esteve fortemente associada às torcidas organizadas e sobressaia como forma de diversão e, hoje, a pixação apresenta um tom político mais explicito como uma maneira de dar voz a cidadãos de direito”, defende o pesquisador.
A partir do diálogo com os pixadores e análise dos depoimentos coletados durante os dois anos de pesquisa, Pires entende que a pixação não é simplesmente fazer um escrito ilegal em construções urbanas. “Tem uma questão com a maneira como eles [os pixadores] relacionam entre si e com as regras da escrita nos muros: uma não sobrepõe à outra. Passa também pela maneira como eles organizam a memória da pixação. As pixações antigas nos muros têm valor histórico para esta forma de escrita, assim eles respeitam cada uma dessas pixações. Trata-se de um processo de trabalho de organização da história dessa própria forma de escrita”, afirma.
Ao todo, cinco pixadores de Belo Horizonte participaram da pesquisa. Por meio de encontros e conversas, Pires observou que a pixação é importante para o registro e compartilhamento da história de um local e de parte da sociedade. “A prática gera também um sentimento de pertencimento. O estudo sobre a pixação é uma maneira de pensar a cidade a partir de seus usuários“, finaliza.