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“Volta às aulas de língua portuguesa. E o que temos a ensinar? Parece que os alunos já são tão espertos e sabidos. Teclam, acessam, clicam, enviam, anexam, fotografam, e muitas vezes, ali, na frente dos professores, com a sem-cerimônia de quem conhece, gosta e pratica” (Luiz Fernando Gomes, prefácio do livro Tecnologias para Aprender de Carla Coscarelli)

Todo educador, que vive de forma reflexiva o ensino e aprendizagem, já parou para repensar modos de aplicação de conteúdos em sala de aula. Volta e meia, professores criam métodos para envolver os alunos nas disciplinas que lecionam e plantam uma semente de inovação na educação.

Esse é o caso de Rodrigo Alves dos Santos, professor de Língua Portuguesa, Literatura e Cultura do Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET-MG), campus Divinópolis. Desde 2012, ele coordena o projeto Uso de jogos como atividades de fixação e revisão de conteúdos de literaturas de Língua Portuguesa, uma forma de complementar a missão de formar leitores no ensino médio.

Alunos voluntários Laura Ferreira Santos, Lucas Niess e Mário Vitor Kern. Eles mostram o jogo Turvo, um game de memória sobre Ferreira Gullar. 

O grupo de pesquisadores envolvidos no projeto desenvolve jogos analógicos e digitais usados como estratégias de promoção da aprendizagem de conteúdos de literaturas de língua portuguesa, incluindo a brasileira, a portuguesa e as africanas de língua portuguesa. Os jogos são uma alternativa àqueles exercícios tradicionalmente encontrados nos livros didáticos, que, segundo o professor, podem ser pouco atraentes para estudantes do ensino médio.

Os jogos

No início do projeto, a pretensão era desenvolver apenas jogos analógicos, por isso criaram um bingo sobre o Barroco e um perfil sobre o Romantismo Brasileiro. Dado o sucesso das primeiras criações, entre professores e alunos, aumentaram o número de jogos contemplando atividades sobre literaturas africanas de expressão portuguesa.

Por sugestão dos próprios jogadores, iniciaram o desenvolvimento de protótipos para games nos computadores, com ou sem o uso de internet. Atualmente estão na fase de pesquisa e criação dessas ferramentas. O projeto é interdisciplinar e envolve alunos dos ensinos médio e superior.

O grupo também prioriza questões ambientais, por isso fizeram protótipos de embalagens para acomodar os jogos em um kit a ser distribuído em escolas púbicas de nível médio. As embalagens são feitas com tecidos descartados por empresas de confecção em Divinópolis. Segundo o professor, o grande objetivo do projeto é que os jogos possam chegar a outras instituições de ensino.

Quem faz este projeto

Além do prof. Rodrigo Alves, o projeto conta com os bolsistas FAPEMIG Guilherme Gazzinelli e Matheus Lara (estudantes do curso superior em engenharia), com alunos voluntários do curso técnico de Informática do campus Divinópolis (Laura Ferreira Santos, Lucas Niess e Mário Vitor Kern). O ex-aluno da instituição e ex-bolsista do projeto – Orlando Enrico Liz – atualmente estudante de Ciência da Computação da UFMG, é coorientador do projeto. Vários bolsistas já passaram pelo grupo. Eram estudantes dos cursos técnicos de Produção de Moda, Informática, Eletromecânica, além do curso superior em Engenharia Mecatrônica.

Premiações

No mês de setembro, os pesquisadores apresentaram o projeto na mostra Inova Minas da Fapemig e foram selecionados para a Feira Internacional de Negócios, Inovação e Tecnologia (FINIT), que acontecerá entre 31 de outubro e 5 de novembro deste ano. Os jogos já foram apresentados e premiados em evento no Colégio Técnico de Campinas (Cotuca-Unicamp), Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace) e Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (Mostratec).

Entrevista com professor Rodrigo

MFC: Quais motivações para desenvolver jogos como atividades de fixação e revisão de conteúdos de Literaturas de Língua Portuguesa?

Professor Rodrigo: Sobretudo minha experiência como professor nos níveis médio e superior. Sou formado em letras há mais de 20 anos, atuando na área e pesquisando a formação de leitores de literatura. Levo em conta as experiências de colegas e minhas análises de livros didáticos. Vi a carência de material para trabalhar com literatura. Existem muitos jogos para ensino de matemática, por exemplo, mas na área da leitura não. Convidei um grupo de alunos e começamos a montar os jogos.

Da esquerda para a direita: o bolsista BIC FAPEMIG Guilherme Gazzinelli; o coorientador do Projeto Orlando Enrico Liz; o bolsista BIC FAPEMIG Matheus Lara e o orientador do Projeto, Prof. Rodrigo Alves. Foto: Alba Valéria

Apresentamos em escolas de Divinópolis e levamos para congressos. O grupo de alunos do projeto cresceu e surgiu interesse dos estudantes do ensino superior em participar. Foi uma ousadia bem sucedida porque a gente conseguiu dar uma pegada tecnológica para a leitura, para as letras. Os estudantes se empolgaram e os professores começaram a gostar dos protótipos. O projeto foi ganhando fôlego e a motivação crescendo, quando percebemos que havia grande receptividade.

MFC: Como é trabalhar no projeto com alunos de graduação e ensino médio?

Professor Rodrigo: Experiência maravilhosa. É o que me prende ao CEFET. Atuo em outros níveis de ensino, mas sou entusiasta do ensino médio. O CEFET é uma das raras instituições que permite a gente iniciar o aluno numa trajetória cientifica. Estar ao mesmo tempo com graduandos, cria no aluno do ensino médio um mundo de possibilidades. Ele se vê pesquisador, conhece processos de agência de fomento, constrói um currículo Lattes, participa de competições. Esses contatos em todos níveis é muito rico.

Uma das grandes promessas que precisamos cumprir com nossa juventude é ensinar o jovem a se construir um cientista. Mostrar o cientista como uma construção, para escapar um pouco daquela ideia da genialidade e desmistificar a ciência. No caso dos jogos, o aluno vê o trabalho materializado, recebe um elogio e pensa: “foi minha ideia”.

Isso reforça a importância da inovação nesse âmbito da leitura. Tem muita coisa acontecendo nas escolas por aí. A gente precisa dar visibilidade para essas iniciativas para escapar do lugar comum de que jovem não lê, jovem não quer saber de literatura. É possível, por meio de uma simples cruzadinha, o aluno brincar e de repente, estar falando sobre literatura ou sobre um autor clássico.

Luana Cruz

Mãe de gêmeos, doutoranda e mestre em Estudos de Linguagens pelo Cefet-MG. Jornalista graduada pela PUC Minas. É professora em cursos de graduação e pós-graduação.

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