O Museu da Vida / Fiocruz, no Rio de Janeiro, reuniu nos dias 31 de julho e 1º de agosto alguns dos nomes de maior destaque no cenário nacional e internacional da pesquisa em comunicação pública da ciência. Com o tema “A ciência da divulgação científica: a construção de um campo acadêmico“, o simpósio trouxe representantes de diversas instituições e países para refletir sobre estudos da área de divulgação científica e apontar caminhos para pesquisas futuras.
[quote align=’right’]”A comunicação pública da ciência desempenha um importante papel nas moldagens da própria ciência”, B. Lewenstein.[/quote] Bruce Lewenstein, professor da Universidade Cornell (EUA), abriu o debate com uma reflexão sobre o passado, o presente e o futuro da comunicação da ciência. A partir da discussão sobre “o que é, afinal, comunicação científica“, tratou da variedade de termos utilizados para designar tais ações, como vulgarização, popularização, divulgação, disseminação e observou: “O que estamos interessados em pesquisar vai depender muito de como definimos o que é a comunicação da ciência”.
Fazendo uma retrospectiva da pesquisa e da prática em divulgação científica nos Estados Unidos, Lewenstein destacou também que os processos de comunicação pública da ciência não devem ser entendidos em uma lógica linear de informação, no que ficou conhecido como o modelo do déficit.
Outro aspecto destacado foi de que é preciso definir de qual “ciência” se fala ao fazer divulgação científica: “Afinal, a história é escrita pelos vencedores, e a ciência não foge a essa regra. De que ciência estamos falando?”.
Necessidades institucionais, motivações políticas e questões relacionadas a dinheiro e financiamento foram também pontos destacados na fala do pesquisador: “Aspectos do ativismo social que sempre acompanha o debate científico ainda são incipientes nos estudos da área. Também a questão da autoridade científica, da confiança e do ethos do cientista podem ser melhor explorados, principalmente em recortes de questões sociais, raciais, étnicas e de gênero”, sugeriu.
Diagnóstico da pesquisa no Brasil e no mundo
Luisa Massarani, diretora da Red de Popularización de la Ciencia y la Tecnología en América Latina y el Caribe, e também pesquisadora do Museu da Vida/COC/Fiocruz, e Marina Joubert, da Universidade Stellenbosch da África do Sul, apresentaram um diagnóstico da pesquisa em comunicação científica a partir de mapeamento da produção acadêmica sobre o tema na América Latina e no mundo, respectivamente. Em ambos os casos, foram considerados periódicos da área para o levantamento de dados, como o JCOM, PUS e Science Communication.
Um estudo semelhante foi apresentado no segundo dia de evento por Melanie Smallman, do University College London, Reino Unido, que alertou para a grande quantidade de estudos de caso realizados na área. A pesquisadora indicou a necessidade de realização de pesquisas mais abrangentes que possam tirar conclusões gerais sobre o volume de estudos pontuais já publicados.
Ciência, internet e redes sociais
Dominique Brossard, da Universidade Wisconsin-Madison (EUA), falou em sua apresentação sobre os desafios e as oportunidades da relação entre ciência e redes sociais.
Destacando o papel dos algoritmos na influência do consumo de informações online, a pesquisadora apresentou estudos realizados por sua equipe com a ajuda de softwares e inteligência artificial.
Um dos estudos, uma análise comparativa em três idiomas sobre como informações sobre o zika vírus circularam nas redes sociais, foi apresentado no congresso WAPOR, em Lisboa. Clique aqui e confira o resumo.
Brossard destacou, ainda, a importância dos elementos secundários às notícias e informações científicas, como comentários, curtidas, compartilhamentos e visualizações. Sua relevância está no fato de poderem impactar e modificar o modo como as pessoas compreendem ou reagem ao conteúdo científico, para o bem ou para o mal.
Yurij Castelfranchi, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), fechou o evento com uma instigante apresentação sobre os desafios para o campo da divulgação científica.
Citando desde as controvérsias científicas, como o crescimento dos grupos anti-vacinação, até pesquisa recente sobre a percepção dos mineiros sobre a ciência, destacou: “Os brasileiros que têm mais interesse em ciência são os que têm mais engajamento político”.
“Pode parecer uma contradição, mas é justamente aí que temos que olhar. Em português, chamo de gambiarra o modo como as pessoas se apropriam das informações científicas, mas dão sentido a elas a partir de uma mistura com suas crenças, sua fé, seus posicionamentos políticos, contextos sociais e emocionais”, explicou Castelfranchi.
[quote align=’right’]”O que chamamos de divulgação científica são práticas absolutamente políticas”, Y. Castelfranchi[/quote] Além dos pesquisadores citados, também estiveram presentes no evento Ildeu Moreira (SBPC), Martha Marandino (USP), Sibele Cazelli (Mast), Simone Pallone (Unicamp), Claudia Juberg (UFRJ), Jéssica Norberto (Fundação Cecierj), Luiz Bento (Fundação Cecierj), Luís Amorim (Museu da Vida/COC/Fiocruz) e Carla Almeida (Museu da Vida/COC/Fiocruz), além de pesquisadores e profissionais da área.
Fortes laços entre prática e pesquisa
O campo de estudos da divulgação científica é caracterizado por uma forte militância e atuação prática, tendo boa parte de seus pesquisadores atuado como comunicadores, jornalistas e/ou divulgadores de ciência. Como campo acadêmico, a comunicação pública da ciência ainda se consolida no Brasil, e busca autonomia institucional.
Na Fiocruz, já existe a oferta de cursos de Especialização e Mestrado na área, assim como no LabJor /Unicamp. Na UFMG, a Formação Transversal em Divulgação Científica é uma opção para estudantes de graduação e pós-graduação que querem se especializar na área.
Outros eventos sobre o tema
No fim de agosto, em Buenos Aires, Argentina, o encontro da RedPOP reunirá pesquisadores e profissionais que atuam em divulgação científica para discutir as conexões entre diversos modos de popularizar a ciência. A equipe Minas Faz Ciência estará no evento para apresentar resultados das ações de divulgação realizadas pelo Programa de Comunicação Científica, Tecnológica e de Inovação da Fapemig.
Já a Rede Mineira de Comunicação Científica (RMCC) realiza em 29 de agosto a 4ª edição do Fala, Ciência, evento que promove workshops e palestras sobre comunicação pública da ciência e tecnologia. Voltado tanto para pesquisadores que se interessam por aprimorar suas habilidades em divulgação, quanto para jornalistas e divulgadores interessados em ciência, tecnologia e inovação, o Fala, Ciência será realizado pela primeira vez na Universidade Federal de Viçosa (UFV). Em breve, mais informações!
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