Ágora de gerações e gerações de literatos, intelectuais e boêmios, a Cantina do Lucas, no Centro de Belo Horizonte, transfigurou-se, na noite de ontem, em palco para discussões acerca do mais significativo ambiente para pelejas contemporâneas: a internet.
Ao abordar o tema “Esfera pública ampliada ou palanque virtual? Redes sociais e ativismo”, as professoras Geane Alzamora (UFMG), e Lorena Tárcia (UniBH), trouxeram à tona problemáticas sobre as novas (complexas e múltiplas) faces da atual arena de confrontos argumentativos e, claro, passionais.
Presencialmente reunido em torno de copos de cerveja e substanciosas doses de conhecimento, o público do tradicional bar belo-horizontino teve a oportunidade de pensar as novas estruturas virtuais de convívio e (com)partilhamento de informações, opiniões e sentimentos.
Afinal, a dúvida essencial não cessa de viralizar: “A pluralidade de discursos na esfera pública contribui para a criação de consensos e entendimento ou torna ainda mais confuso o exercício da democracia nos dias de hoje?”
Esfera pública digital?
No ver de Geane Alzamora – que apresentou breves resultados de estudos desenvolvidos junto ao Núcleo de Pesquisa em Conexões Intermidiáticas do Departamento de Comunicação Social da UFMG –, os novos modos de ativismo tornam intrincada a relação entre informações divulgadas, na web, por cidadãos comuns (sem vínculo profissional com a publicização de notícias/visões de mundo) e as velhas engrenagens da chamada mídia tradicional (rádio, TV, impressos, grandes portais etc.).
Que o diga a construção de rumores e boatos – alimentados tanto nas redes sociais quanto nos meios jornalísticos convencionais –, capaz de alterar a própria natureza dos acontecimentos e produzir, por exemplo, mobilização social. “Foi o que aconteceu, por vezes, durante os panelaços contra a presidente Dilma Rousseff”, lembrou a professora, para quem, de modo geral, as novas formas de convívio e ativismo provocaram mudanças significativas nos princípios de Modernidade vigentes no século XX.
Além de abordar questões relativas à inteligência coletiva, ao ciberativismo, à profanação e à educomunicação, Lorena Tárcia lançou importante desafio ao público – no sentido de alterar os rumos da propalada intolerância fomentada via web: “Como concentrar a energia das redes numa perspectiva do bem comum?”. A saída, de certo modo, estaria na própria natureza humana. “Somos, afinal, seres acostumados a contar histórias. E cada um tem sua forma de fazê-lo. Por que, então, não nos abrirmos à possibilidade de narrativas complexas, engendradas coletivamente?”, completou.
A pesquisadora destacou, por fim, a inexistência de modelos cristalizados para uso das chamadas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Ao citar Giorgio Agamben e Michel Foucault (1926-1984), Lorena discutiu a importância de as pessoas não se tornarem reféns de algoritmos comandados por grandes grupos empresariais. “É preciso repensar os sentidos do dispositivo. Não é porque dizem que o lápis serve para escrever que só daremos tal função a ele”, complementou.