texto: Camila Alves Mantovani
arte: Felipe Bueno
Em todo mundo, os desafios para produção de alimentos têm se dado em virtude, principalmente, das condições climáticas adversas. No entanto, algumas áreas, que já apresentam clima desfavorável, têm sofrido, ao longo dos anos, com o agravamento do problema.
No Brasil, a região do semiárido, caracterizada por escassez de água e altas temperaturas, desafia, desde sempre, o cultivo agrícola. Sendo assim, a partir da década de 1970, marco da implantação da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), políticas públicas a envolver a criação de centros de pesquisa e ensino – dentre outros aspectos – têm sido implementadas no local.
Em Minas Gerais, o semiárido se localiza na região Norte e no Vale do Jequitinhonha, e, nos últimos anos, tem reescrito sua história no contexto nacional. O “sertão” da secura e da fome, tão bem retratado em obras como a de Guimarães Rosa, destaca-se, hoje, pela diversidade de produções agropecuárias – do cultivo de subsistência às atividades economicamente sustentáveis, como a fruticultura irrigada e a pecuária.
Atualmente, a região do semiárido mineiro é a segunda maior produtora de rebanho bovino no Estado.
No que se refere à fruticultura, além do investimento em tecnologias de irrigação, fator essencial ao cultivo na região, outras técnicas têm sido pesquisadas para auxiliar e tornar mais eficiente o manejo das culturas no semiárido. É o caso do projeto “Reguladores vegetais no manejo da produção e fixação de frutos na mangueira”, desenvolvido pelo pesquisador Moacir Brito Oliveira, da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
Nos últimos três anos, o aumento da temperatura trouxe muitos desafios aos produtores.
“Uma das consequências do aumento da temperatura é a perda de polinização, o que leva a uma produção inviável para o mercado. Uma planta que produzia 300 frutos, por exemplo, começa a produzir 100, 150 frutas, que não se desenvolvem, pois a alta temperatura e a baixa umidade dificultam o aparato fotos- sintético do vegetal, levando-o a uma produção irregular”, explica Moacir.
Para reverter a situação, uma das técnicas elaboradas pelo pesquisador, com sucesso, refere-se ao uso de reguladores vegetais (na verdade, fitorreguladores) para o cultivo da mangueira. Os “reguladores de crescimento” são compostos químicos sintéticos usados com o objetivo de controlar o desenvolvimento vegetativo, de modo a aumentar a capacidade reprodutiva da planta.
A pesquisa
No projeto, Moacir Brito trabalhou com um regulador de crescimento chamado paclobutrazol (PBZ), que, aplicado no solo, paralisa o crescimento vegetativo, ao inibir a síntese da giberelina – um hormônio – e ao permitir a manipulação do vegetal durante todo o ano.
O uso dos fitoreguladores varia conforme o método de aplicação do produto e a concentração usada. O objetivo principal da pesquisa foi avaliar os efeitos da aplicação de diferentes doses de PBZ, na mangueira Palmer, sobre a paralisação do crescimento vegetativo, a indução floral, e as características vegetativas e reprodutivas do cultivo na região Norte de Minas Gerais, durante a entressafra. Nos estudos, percebeu-se a possibilidade de redução da quantidade de regulador vegetal usada no solo: de 1g a 1,5 g por metro quadrado de cota de planta, chegou-se – conforme recomendação comercial – a 0,7g, com resultados eficientes.
De acordo com Moacir Brito, a redução do uso de reguladores tem impacto importante não apenas em termos de custos ao produtor, mas, também, no que se refere ao meio ambiente. Isso porque, ao usá-los, põe-se em risco a vida abaixo do chão.
“O PBZ diminui a respiração do solo, o que prejudica os organismos vivos ali existentes. Com o uso de menores quantidades de regulador, a molécula se degrada mais rapidamente, e, assim, a terra se recupera em maior velocidade. Ou seja, diminui o impacto na biota do solo”, explica o pesquisador.
Além das pesquisas para manejo do PBZ de forma mais sustentável, no doutorado, Moacir conduz estudos que buscam outras opções de reguladores, a serem usados, por exemplo, na folha da planta, sem prejuízos ao solo. “Inicialmente, o objetivo era avaliar os diferentes reguladores vegetais da cultura, aplicados no manejo floral da mangueira, de forma a continuar o eficiente escalonamento de produção”, esclarece, ao lembrar, porém, o surgimento de variáveis importantes a serem analisadas. “Ao aplicar reguladores, aumenta-se a produção de etileno, hormônio que, sintetizado de forma continuada, reduz, ou impede, a fixação de frutos”, completa.
Fruta na mesa
No norte de Minas Gerais, a área reservada ao cultivo da manga corresponde, atualmente, a 5.200 hectares. Espera-se que tal espaço, nos próximos anos, seja ampliado. Segundo Oliveira, atualmente, a região produz, em média, 700 toneladas da fruta por semana, das quais 120 são exportadas. “Até 2017, esperamos atingir até 6,5 mil hectares. A variedade Palmer cor- responde a 95% de nosso cultivo e atende muito bem aos mercados interno e externo. A polpa é amarelada, firme e apresenta bom sabor, com pouca ou nenhuma fibra”, conta.
O pesquisador destaca, ainda, o fato de a região ser a única do Brasil a produzir frutos de ótima qualidade com regularidade, incluindo períodos de entressafra. Para Moacir, um dos principais fatores responsáveis pelos bons resultados é a integração da universidade com a região. A interlocução é bastante produtiva, tanto do ponto de vista de transferência de tecnologia como sob a ótica da formação.
“Todo o trabalho de tecnologia da região com as culturas tropicais conta com participação da universidade. Podemos dizer que ela tem desempenhado papel fundamental, ao atuar na formação de profissionais e no desenvolvimento de tecnologias aplicáveis”, conclui.
Culturas Diversas
Pesquisas recentes, conduzidas pela Embrapa Semiárido, têm mostrado que não apenas o cultivo de frutas tropicais é possível na região, mas, também, o de espécies dos climas subtropical e temperado. Relatório divulgado pelos pesquisadores Paulo Roberto Lopes e Inez Vilar Oliveira revela que o principal exemplo é o da videira, que apresenta ótima produtividade e alta qualidade.
As condições edafoclimáticas – relativas às características do solo para cultivo vegetal – da região têm sido capazes de assegurar o bom desempenho de frutos como a banana, a manga e, até mesmo, o morango. “No caso, culturas como a macieira, a pereira, o caquizeiro e a ameixeira estão sendo introduzidas e avaliadas, com o objetivo de encontrar novas opções de cultivo para os produtores”, explicam os pesquisadores.