Dentre as diversas ações para promover a conscientização ambiental, destacam-se as abordagens que têm como referência o princípio dos 3Rs, apresentado na chamada “Agenda 21”, a saber: redução, reutilização e reciclagem. Apesar de serem bastante difundidos, tais princípios ainda encontram barreiras em sua implementação, principalmente, quando se observa o consumo cotidiano dos cidadãos comuns. Além de questões voltadas à mudança de comportamento, é patente o desconhecimento do que pode ser feito com determinados resíduos, como o óleo de cozinha.
Com o intuito de contribuir para uma melhor gestão dos detritos, bem como de promover atitudes ecologicamente corretas, pesquisa coordenada pela professora Marisa Alves Nogueira Diaz, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), busca produzir sabão e sabonetes medicinais a partir de óleo residual, aliado à investigação e à comprovação da existência de propriedades farmacológicas pesticidas em extratos de plantas da região de Viçosa (MG).
De acordo com a pesquisadora, o descarte do óleo usado na cozinha é um grave problema ambiental, especialmente, no Brasil. Caso o material seja despejado nas pias de cozinhas, ainda que ocorra o processo de tratamento de esgoto, parte do líquido permanece retida no encanamento, de modo a atrair diversos tipos de pragas, além de contribuir para enchentes, tão frequentes nos grandes centros urbanos do País. Importante ressaltar, ainda, que o óleo chega intacto aos rios e às represas, fica na superfície da água e pode impedir a entrada de luz – elemento que alimentaria o fitoplâncton, conjunto de organismos essenciais à cadeia alimentar aquática.
Os recursos hídricos, porém, não são os únicos a sofrer os impactos do descarte. Ao atingir o solo, o óleo também promove sua impermeabilização, dificultando o escoamento de água das chuvas. Além desse problema, a demorada decomposição do material promove a emissão de metano – o gás do chamado “efeito estufa” – na atmosfera, contribuindo com o superaquecimento terrestre.
Motivações e estudos
Ao chegar em Viçosa em 2006, Marisa Diaz oferecia um curso na Semana do Fazendeiro, tradicional evento da região, intitulado “Sabão Rural”. Em suma, o objetivo da iniciativa era promover a conscientização acerca do meio ambiente, aliada ao problema de descarte do óleo de cozinha. À época, para que as aulas ficassem mais atrativas, a pesquisadora decidiu acrescentar, ao sabão feito com óleo residual, plantas medicinais com atividades farmacológicas já comprovadas – principalmente, antimicrobianas, sarnicidas e carrapaticidas.
Inspirada pela experiência, dois anos mais tarde, a professora aprovou, na FAPEMIG, o projeto de pesquisa que seria realizado em parceria com a empresa júnior In Bio, ligada ao curso de Biologia da UFV. A proposta era pesquisar plantas medicinais com atividade antimicrobiana e incorporá-las ao óleo vegetal residual.
“Deu tão certo que trocamos o óleo residual pelo de macaúba e desenvolvemos um sabonete a partir da planta aquática que pesquisávamos à época. O processo foi patenteado, além de ter gerado trabalhos acadêmicos”.
A partir daquela primeira proposta, surgiram outras diversas proposições de pesquisa, como o projeto “Obtenção e avaliação de produtos fitossanitários alternativos para uso no controle de mastite bovina”, que conta com o apoio do CNPq e conta, entre seus desdobramentos, com a produção de sabão com propriedades farmacológicas. Neste caso, contudo, o foco está no pequeno produtor, que, conforme ressalta a pesquisadora, não tem condição financeira de usar antibióticos para tratar a mastite bovina. O produto serviria, portanto, como alternativa para assepsia das mãos, antes da manipulação do animal. Reduz-se, assim, o risco de contaminação e disseminação da doença no rebanho.
“Além disso, a pesquisa objetiva a realização de um estudo fitoquímico das plantas mais ativas, para verificar qual o princípio ativo responsável pelo efeito. No momento, fazemos a associação de plantas nas formulações. Testamos uma espécie in vivo e os resultados foram promissores. Agora, esperamos o parecer da comissão de ética para iniciarmos os testes – também in vivo – com outras variedades”, conclui.
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Faça você mesmo!
Devido ao sucesso do curso “Sabão Rural”, Marisa Diaz foi convidada a produzir aulas a distância, de modo a oferecê-las no site do “Espaço do produtor”, iniciativa da UFV. Na internet, são apresentadas as informações para quem deseja iniciar-se no ofício da produção de sabões a partir de óleo usado. Segundo a pesquisadora, o processo é bastante simples e não requer equipamentos ou instrumentos sofisticados. Além disso, a fabricação pode ocorrer numa cozinha convencional, desde que todos os recipientes e instrumentos estejam bem higienizados.
Quanto à variedade dos produtos, é preciso partir da receita de sabão básico, para, em seguida, investir nos modelos com propriedades farmacológicas. O sabão de losna ou arruda, por exemplo, pode ser usada no combater a piolhos e lêndeas; já o de erva-de-santa-maria é ótimo contra pulgas. Quanto ao uso dos sabões em seres humanos, a pesquisadora ressalta que, para além das mãos, deve-se evitar receitas elaboradas a partir do óleo de cozinha. Isso porque, em peles sensíveis, há o risco de reações alérgicas, apesar da filtragem dos resíduos líquidos.
E aí, quer produzir seu próprio sabão? Confira a receita abaixo:
Material necessário
- Fogão comum e/ou forno de microondas doméstico
- Balança de cozinha
- Recipientes de alumínio ou ágata
- Copo becker de plástico ou similar para medidas de 1000 ml
- Colher de pau ou bastão de vidro
- Fôrmas variadas de PVC e/ou silicone
- Peneira
- Coador de óleo de cozinha
- Congelador ou freezer
Ingredientes para sabão básico
- 150g de sebo
- 225 ml de óleo de soja de cozinha usado e filtrado
- 62,25g de soda cáustica
- 250ml de álcool comercial
Modo de preparo
Dissolva e filtre previamente o sebo. Adicione o óleo de cozinha usado e filtrado. Separadamente, dissolva a soda em 125 ml de água. Coloque o sebo e o óleo em um recipiente grande e adicione o álcool. Aqueça ligeiramente a mistura e junte a solução de soda; mexa bem, até ficar cremosa. Numa fôrma, despeje o sabão ainda mole e deixe esfriar. Corte os pedaços de sabão depois de frio. (Observação: no lugar do sebo, pode-se usar a base para sabonete de glicerina transparente ou branca.)
Texto originalmente publicado na edição nº 58 da Minas Faz Ciência.
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