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Fibras vegetais na construção civil

Imagem meramente ilustrativa

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Colaboração: Vivian Teixeira

Nas três últimas décadas, diversas pesquisas têm se dedicado a encontrar uma opção ao uso da fibra de amianto (substância comprovadamente cancerígena) em produtos de fibrocimento amplamente utilizados na construção civil para a fabricação de telhas, caixas d’água e componentes pré-fabricados em geral.

O fibrocimento é uma mistura de fibras (vegetais, sintéticas ou minerais) com o cimento e outros aditivos, apresentando uma densidade relativa menor que os materiais cerâmicos e maior resistência ao impacto. Além disso, é um produto que possibilita a obtenção de peças com geometrias diversas, podendo ser utilizado como material pré-moldado na construção seca, diminuindo resíduos na construção.

Em países desenvolvidos, após o banimento do amianto, a solução encontrada para continuar a produção do fibrocimento foi a adaptação do principal processo produtivo (Hatschek – processo de fabricação de telhas de cimento-amianto mais utilizado mundialmente, patenteado em 1900 por Ludwig Hatschek) incorporando polpas celulósicas e/ou fibras poliméricas.

O uso do fibrocimento nestes países se mantém graças a constantes aperfeiçoamentos das matérias-primas e processos produtivos. Entretanto, as novas tecnologias para produção de fibrocimento sem amianto requerem altos investimentos, algumas vezes impraticáveis na realidade de países como o Brasil.

Diante da demanda por processos alternativos mais baratos e seguros para a saúde da população, o professor Gustavo Henrique Denzin Tonoli, da Universidade Federal de Lavras (UFLA) teve o projeto “Extrusão de materiais construtivos de fibrocimento reforçados com fibras lignocelulósicas” financiado pela FAPEMIG.

“O fato de existir uma expectativa de banimento das fibras de amianto gera o interesse e a necessidade por fibras alternativas. As fibras vegetais são materiais muito interessantes, que podem suprir essa demanda, apesar de ainda exigirem alguns cuidados quanto a sua durabilidade em condições extremas. Portanto, o desafio de resolver esse problema e encontrar novas aplicações para as fibras vegetais é a nossa motivação” – Gustavo Tonoli.

O que é a extrusão?

No Brasil, é um processo utilizado principalmente para produtos cerâmicos e não para produtos cimentícios. Apresenta-se, no entanto, como uma excelente alternativa ao Hatschek utilizado nas indústrias de fibrocimento, por permitir, entre outras vantagens, a produção de compostos cimentícios com geometrias diferenciadas, a utilização de máquinas mais simples para produção continuada, a produção livre de resíduos líquidos e sólidos, e a produção industrial em pequena escala.

Apesar destas vantagens, são necessárias pesquisas para elucidar aspectos fundamentais sobre as variáveis do processo de extrusão, sobre as matérias-primas empregadas e a diminuição de seus custos, sobre a possibilidade de melhorar a dispersão do material de reforço e a durabilidade dos produtos obtidos.

“Geralmente, os estudos tratam de caracterizar as diferentes fibras vegetais, como a de juta, bambu, fibra de coco, piaçava, sisal, entre outras, para identificar suas principais propriedades e composição química que podem direcionar nas diferentes aplicações”, esclarece Tonoli. Entre os estudos mais relevantes da área, está a modificação superficial das fibras vegetais com agentes que repelem a água. Estas modificações têm melhorado o desempenho dos produtos extrudados e aumentado sua durabilidade em relação àqueles reforçados com fibras não-modificadas. Outra pesquisa utiliza nanofibras celulósicas (fibras com o tamanho muito reduzido) para reforçar os fibrocimentos, melhorando o desempenho mecânico.

Fibras vegetais

Uma das estratégias utilizadas na pesquisa do professor Gustavo Tonolino para melhorar o desempenho dos materiais desenvolvidos foi justamente a modificação superficial das fibras lignocelulósicas, materiais biodegradáveis e de caráter renovável, com agentes hidrofobizantes (que repelem a água). “Os resultados demostraram que as fibras lignocelulósicas com a superfície modificada permitiram melhora significativa na durabilidade do produto final”, explica o professor.

Fibras lignocelulósicas são fibras vegetais amplamente utilizadas no nosso dia-a-dia, nas roupas, cordas, tapetes, papel, papelão, etc. Essas fibras recebem esse nome pois apresentam celulose, hemiceluloses e lignina em sua composição. Muitos vegetais apresentam essas fibras facilmente extraíveis como o algodão, o sisal, a juta, a fibra de coco, bagaço de cana-de-açucar. Outros vegetais precisam de processos químicos para sua extração, como é o caso da madeira.

Detalhe do colmo de um bambu. Wikimedia commons. Imagem meramente ilustrativa.
Detalhe do colmo de um bambu. Wikimedia commons. Imagem meramente ilustrativa.

Os produtos de fibrocimento estudados estimulam a utilização de maiores teores de fibras lignocelulósicas, adequadas à necessidade crescente de matérias-primas mais sustentáveis. “Estes produtos podem ser utilizados para a produção de materiais pré-fabricados, o que permite economia e diminuição da produção de resíduos na construção“, destaca o pesquisador.

A pesquisa é também uma importante fonte de informações sobre materiais alternativos para arquitetos, engenheiros civis e engenheiros de materiais interessados em desenvolver produtos que apresentem um resultado estético positivo para a construção, seja através de painéis decorativos de fibrocimento com diferentes texturas (empregando resíduos de culturas vegetais, por exemplo) ou com diferentes geometrias, dificilmente obtidas sem a utilização de reforço interno.

Sustentabilidade na construção civil

De acordo com o professor, materiais alternativos têm atraído a atenção do mercado, “como observado pela reintrodução dos tijolos não-queimados e recente crescimento da utilização do bambu nas construções”. Ele indica, no entanto, que ainda há uma postura muito cautelosa por parte da população no uso dessas opções e, por isso, existe o desafio de mostrar que os materiais naturais podem ser uma ótima alternativa a matérias primas não renováveis. “Também temos a possibilidade de agregar valor pela adição de novas funções a esses materiais como, por exemplo, melhorar o conforto térmico, o visual e a durabilidade”, destaca.

“Os materiais contemplados pela pesquisa permitem o uso da criatividade para o desenvolvimento de diferentes formas e geometrias complexas. O emprego dos compósitos de fibrocimento em placas, telhas de cobertura e componentes pré-fabricados para a construção civil pode representar significativa contribuição para a diminuição do déficit de habitações e para o crescimento da infraestrutura de países em desenvolvimento” – Gustavo Tonolino .

De acordo com a pesquisa, estima-se que aproximadamente 45% das residências, galpões agrícolas ou industriais no Brasil sejam cobertos com telhas de fibrocimento. Portanto, a continuidade da disponibilidade do fibrocimento a baixos custos pode também permitir políticas públicas que garantam aos cidadãos o direito à moradia com maior dignidade.

Entretanto, a viabilidade de produção desses materiais pelas indústrias depende de diversos fatores. “O mercado é exigente e demanda que os produtos tenham grande durabilidade. Acreditamos que seja possível criar e ampliar esse mercado a partir de um apelo ecológico. É comum que os consumidores fiquem presos aos modismos ou a produtos consolidados, sem estarem abertos a produtos e conceitos novos. Portanto, é necessário investir tempo e recursos para conscientização através de ações de marketing verde, demonstrando os benefícios de produtos mais sustentáveis”, conclui o pesquisador.

Imagem de destaque meramente ilustrativa.

Verônica Soares

Jornalista de ciências, professora de comunicação, pesquisadora da divulgação científica.

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